A “liberação” da posse e/ou do porte de arma de fogo é um dos assuntos mais debatidos na atualidade e existem alguns perigos nos discursos (pro) armamentista que, na minha visão, precisam ser abordados.
Já falei sobre a posse e o porte de arma de fogo em outros textos, tanto com relação a minha opinião contrária ao discurso armamentista quanto com relação a questões teóricas, como a diferença entre posse e porte, a mudança legislativa no crime de posse ou porte de arma de fogo de uso restrito, dentre outros.
Neste texto o objetivo é analisar dois discursos armamentistas e contrapô-los com dois (dentre vários) casos reais que tive notícia.
Os discursos a serem analisados são: “Armar o ‘cidadão de bem’ é garantir a ele o direito de defesa.”; e “Bandido bom é bandido morto.”.
Inclusive, temos um candidato à Presidência e vários outros espalhados por aí na disputa por cargos do legislativo que usam esses discursos como o mote da campanha eleitoral, encontrando eco em parcela da população.
Acho que não é só comigo (outras pessoas também devem pensar assim), mas sempre que ouço/leio esses discurso fico a me questionar como será a identificação do “cidadão de bem” armado e do “bandido” armado.
Farão um sinal luminoso que identificará o “mocinho”, diferenciando-o do “vilão”?
Ou, ao verem uma pessoa armada vindo em sua direção, perguntarão com antecedência se ele é um “cidadão de bem” ou primeiro reagirão (à bala) e depois que a vida alheia se for buscarão verificar quem era essa pessoa?
“Cidadão de bem” x “bandido”, além de serem rótulos totalmente descabidos, são duas faces da mesma moeda. Como diferenciar um do outro?
Tenho certeza que os mais radicais e apressados na interpretação do texto já pensaram (ao ler o questionamento acima) que “é muito fácil diferenciar o cidadão de bem do bandido, pois bandido é quem comete crime e cidadão de bem é quem trabalha de sol a sol, batendo lage, pegando 47 conduções para ir e voltar do trabalho, que vai a pé para o trabalho, caminhando 72 horas por dia para chegar, que paga seus impostos, … O cara que escreveu esse texto é muito burro! Ou tá se fazendo de sonso aí na sua cadeira, no ar condicionado, totalmente fora da realidade, defendendo bandido.”
Só que não é bem assim, né?!
Imagine você, autointitulado “cidadão de bem”, com autorização para portar legalmente uma arma de fogo. É fim do expediente, o trânsito está caótico e, de repente, surge um indivíduo correndo, com arma em punho, na direção do seu carro. Qual será a sua provável reação como “cidadão de bem”? Se “proteger” e alvejar o “bandido” que corria armado em direção ao seu carro, não é?
Depois de alvejado e morto, constatou-se que o “bandido” era um “cidadão de bem” e que estava se “protegendo” de outro “bandido”.
“Nossa, Pedro, não viaja! Isso é impossível! Só vai poder ter uma arma quem fizer exames de aptidão técnica e mental, treinamento, …”.
Será que vai mesmo? E mais, mesmo que tudo isso seja efetivamente exigido, existe treinamento que ensine a identificar “bandido”?
O melhor exemplo disso que estou falando são esses dois casos que foram noticiados: “Cabo é morto por PMs após ser confundido com assaltante, em Fortaleza“; e “Policial civil morre após ser confundido com ladrão e baleado por bombeiro“.
No primeiro caso, mais recente, um policial militar reagiu a um assalto e, quando outros policiais o viram armado, atiraram contra ele, pensando que era um “bandido” armado. Vejamos o que diz a notícia:
Um cabo da Polícia Militar do Ceará morreu após ser baleado por outros PMs que o confundiram com um assaltante, na noite desta terça-feira, em Fortaleza. A vítima chegou a ser socorrida para o Instituto Doutor José Frota (IJF), mas não resistiu aos ferimentos.
[…].
Nas proximidades, uma composição do Policiamento Ostensivo Geral (POG) ouviu os tiros e se dirigiu até a rua onde o PM estava, no bairro Parangaba da capital cearense. No entanto,chegando no local, os policiais se depararam com o cabo segurando sua arma, enquanto corria em direção à viatura. Por confundi-lo com um assaltante, dispararam contra ele.
[…].
No segundo, um policial civil investigava a prática de um crime, quando um bombeiro, perseguindo um “bandido”, após uma troca de tiros, pensou que o policial civil (que estava a trabalho) era o “bandido” e o matou:
O crime ocorreu por volta das 16h quando teria ocorrido um suposto tiroteio. Na confusão, uma mulher foi baleada. Um bombeiro, que estava de folga, passava pelo local e foi atrás de algum suspeito.
No mesmo momento, um policial civil estava na região investigando o roubo de carros.
Imagens de câmeras de segurança mostram o policial civil andando na rua à paisana. Em seguida, um carro preto passa pelo local, onde estaria o bombeiro. As imagens não mostram, mas no fim da rua o policial civil é baleado. Ele tenta correr, mas acaba caindo no chão.
Como acreditar, então, que armar a população é trazer segurança? E nem preciso falar que os casos acima demonstrados envolveram exclusivamente pessoas que, pela função que exercem, possuem (ou deveriam possuir) melhores condições técnicas, físicas e mentais para enfrentar situações de risco e, quando necessário (e não a toda hora) utilizar a arma de fogo. Se com eles não dá certo, imagine com um “cidadão de bem”?
Para encerrar, um último discurso armamentista: “O ‘bandido’ vai pensar 2x antes de praticar um assalto, pois não vai saber se a vítima estará ou não armada”.
Na verdade, sem muitas delongas, a frase certa é “O ‘bandido’ NÃO vai pensa 1/2 vez antes de ATIRAR NA VÍTIMA DE um assalto, pois não vai saber se a vítima estará ou não armada”.
Armas não são o caminho, não se iluda.
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Um grande abraço!
Excelente texto, se querem armar nossa população de educação de verdade…
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A população não sabe nem segurar uma caneta, quanto mais uma arma.
Um grande abraço
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Muito bem escrito…. parabéns!!!
Acredito que a base de tudo e o que falta no nosso país seja educação….
Mas tento me colocar no lugar de milhares de familiares que perdem seus entes por conta desta violência maldita…. e de leis frouxas que só facilitam a vida de criminosos!!!
Perdoe-me, é meu ponto de vista!!!
Abraço
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